10 de junho de 2018

Sem Título 108


-------------Ato I-------------

Eles são de todas as cores,
formas, roupas, vozes e gestos
Alguns mais vívidos e falantes
Outros mais simples e honestos...

Alguns gostam de coisas que você detesta
outros lhe defendem de qualquer ameaça
Alguns te chamam pra ir em alguma festa
outros festejam apenas em ter sua presença.

Alguns te ouvem tanto que você mal escuta sua voz
outros falam de maneira tão veloz
que qualquer conselho se dissipa como sal
e as palavras somem antes de alertá-lo de algum mal

E o que é esse item tão diverso e confuso?
Já te dei tantas dicas, não conseguiu perceber?
tô falando de amigo, algo pouco intruso
coisa muito genérica, podendo ser eu ou você.

Como árvores antigas alguns amigos podem ser
evoluem, mudam de forma, cheiro, gosto e amanhecer
Mas continuam resistentes à ventos e chuvas
Apenas choques intrínsecos podem arrancá-las das ruas

Outras são tão fracos e frágeis
que aparentam ter data de validade
O conceito prematuro de amizade se esvai
por vaidades, mil verdades, além margem.

-------------Ato II-------------

É apenas estando fora de casa
fora da praça, fora da massa, fora da alma
que consigo refletir algum valor
que consigo entender algum sabor

Os momentos de desespero
de agonia e de lamúria, são postos de lado
agora eu simplesmente deixo vir e ir.
talvez eu tenha sentido a cor do devir

Aqui as folhas continuaram iguais.
algumas amarelar-se-ão e depois cairão secas, frias
outras nascem logo em seguida
sendo todas igualmente pelo vento varridas

Proíbo-me de falar por um momento
reservo-me para ouvir apenas o vento
que conta lentamente em ondas pelo ar
não há sentimento no mundo que não possa findar.

O vazio me consome como nunca o fizera antes
mas desta vez reservo uma xícara de café com adoçante
e aprecio um pedaço do seu dessabor
o que é um chá da tarde sem algum resplendor?

Não se trata mais de ir ou de ficar
eu nunca estive, nem vou estar
as vezes penso que nunca o sou de fato
mas a essência precede a existência...lembro desse ato.

Meu discurso de amizade epicurista
schopenhaurerianamente se perdeu
difundiu-se em vazios tão rasos
e apenas em minha alma permaneceu.
------------Ato III-----------

As coisas caminham devagar
agora sou apenas um passageiro sem nome
reservo-me ao esquecimento
enquanto tento não lembrar.

Da infância que tive, ou ao menos pensei.
da adolescência que jamais tentei
da adultescência que se apossou de mim
de todas as músicas que nunca ouvi.

Do sonho que já mudou tanto de rosto
mas sempre ficou igual
de ser reconhecido e visto
talvez esse seja meu mal.

Da família que queria construir
mas faltam-me esforços para tentar
falta-me vontade para gerar
um desejo de chamar um outro inferno, de lar.

No fim da tarde retorno a camisa de força
cubro-me de álcool e fumo
o dia passa rápido, eu me acostumo.
e três novos atos retornam amanhã

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