13 de setembro de 2016

Epicuro: A amizade no luxo e no escasso

Ao retornar para Atenas em 306.a.c com a idade de 35 anos, Epicuro formou um arranjo doméstico insólito. Estabeleceu-se em um casarão um pouco afastado do centro de Atenas, no bairro de Melite, entre o mercado e o porto de Pireu, e mudou-se para lá com um grupo de amigos.

Entre eles estavam Metrodoro e sua irmã, o matemático Polieno, Hermarco, Leonteu e sua esposa Temista, e um comerciante chamado Idomeneu (que não tardou em desposar a irmã de Metrodoro). Havia espaço suficiente para que os amigos tiversse seus próprios aposentos e havia cômodos destinados às refeições e às conversas em grupo.

Epicuro observou que:
"De todas as coisas que nos oferece a sabedoria para a felicidade de toda a vida, a maior é a aquisição da amizade".

Seu interesse em viver na companhia de pessoas afins era tão intenso que ele recomendava que jamais se comesse sozinho:
"Antes de comer ou beber qualquer coisa, pondere com mais atenção sobre com quem comer e beber do que sobre a comida ou a bebida, pois alimentar-se sem a companhia de um amigo é o mesmo que viver como um leão ou um lobo".

A casa de Epicuro assemelhava-se a uma grande família, mas aparentemente não havia lugar para o mau humor ou para qualquer sensação de confinamento, apenas solidariedade e gentileza.

Só passamos a existir quando alguém acompanha nossa existência, o que dizemos só passa a ter significado quando alguém consegue entendê-lo. Viver cercado de amigos é ter constantemente nossa identidade confirmada; o fato de eles nos conhecerem e se preocuparem conosco tem o poder de nos tirar de nossa indolência. Em seus pequenos comentários, muitas vezes importantes, revelam conhecer nossas fraquezas e aceitá-las e, dessa forma, por sua vez, aceitar que temos um lugar no mundo.

Podemos pergunta-lhes "Ele não é assustador?" ou " Você já percebeu alguma vez que..." e sermos compreendidos, em ver de recebermos respostas enigmáticas como "Não,não exatamente" - que podem nos fazer sentir, mesmo em companhia de outrem, tão solitários quantos exploradores polares.

Verdadeiros amigos não nos julgam de acordo com critérios seculares, é nossa personalidade que lhes interessa; como pais ideais, o amor que nos dedicam não é afetado pela nossa aparência física ou pela posição que ocupamos na hierarquia social. Dessa forma não temos escrúpulos em nos apresentar diante deles malvestidos ou revelar que ganhamos pouco dinheiro este ano. O desejo de ter riqueza talvez não deva ser sempre entendido como ânsia por uma vida luxuosa. Um motivo mais importante talvez fosse o desejo de ser amirado e bem tratado. Podemos almejar a fortuna como o único objetivo de assegurar o respeito e a atenção de pessoas que em outras circunstâncias, nos desprezariam. Epicuro, ao discernir nossa carência subjacente, reconheceu que um punhado de bons amigos sinceros poderia prover o amor e o respeito que mesmo a riqueza não traz.


Alain de Botton em As consolações da filosofia. pgs 72~74

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